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ANS é omissa e protagonista do caos Unimed Paulistana

18 de novembro / 2015
Direito nas Áreas Médica e de Saúde

Omissa porque não presta informação em tempo hábil para o consumidor adotar medidas protetivas de seu interesse e protagonista porque optou, conscientemente, por medidas que favoreceram as empresas do setor de saúde privada em prejuízo dos consumidores, que foram expostos à situação de extremo risco, pois não tiveram cobertura do serviço de assistência médica contratado desde o dia 02/09/2015 e ainda tiveram que pagar pelo serviço não prestado.

No dia 02/09/2015, a Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS – determinou a alienação compulsória da carteira de clientes da Unimed Paulistana.

O serviço oferecido pela Unimed Paulistana já era precário antes da intervenção da ANS e, com o anúncio da alienação compulsória da carteira, o serviço deixou de existir, expondo os mais de 700 mil beneficiários da Unimed a situações de risco imediato à saúde e integridade física.

A medida era necessária?

Sim. Era uma questão de tempo até a Unimed Paulistana decretar a própria insolvência (sim, o termo é insolvência e não falência, já que se trata de uma cooperativa médica).

A ANS tinha conhecimento da crise interna da operadora de saúde?

Absolutamente. A Unimed Paulistana passou por 3 direções fiscais da ANS desde o ano de 2009. A direção fiscal é implantada quando a operadora de saúde apresenta graves problemas de gestão financeira e administrativa.

Além disso, a ANS conta com muitos outros recursos de informação que lhe possibilita conhecer problemas administrativos e de gestão das operadoras de saúde.

A ANS sabia que os consumidores da Unimed Paulistana ficariam sem cobertura após ser determinada a venda compulsória da carteira de clientes?

A situação era totalmente previsível.

Os prestadores de serviços até então credenciados da Unimed Paulistana já estavam, pouco a pouco, suspendendo a prestação de serviços por falta de pagamento. A partir do momento em que a ANS determinou a venda da carteira de clientes, era certo que os demais prestadores de serviço também romperiam o contrato. Eles não são obrigados a prestar serviço sem a contraprestação financeira e a Unimed Paulistana, que já não conseguia pagar os prestadores de forma regular, não teria nem mesmo a renda das mensalidades futuras para honrar as despesas médicas de seus clientes.

O processo de migração dos clientes da Unimed Paulistana para outras operadoras foi conduzido de forma regular pela ANS?

Absolutamente NÃO. A impressão deixada pela agência reguladora, transcorridos mais de 60 dias desde a ordem para venda da carteira de clientes, é que as medidas adotadas buscaram beneficiar as demais empresas do setor de saúde privada, sem nenhum cuidado com o consumidor.

Em que ponto as demais operadoras de saúde foram beneficiadas?

Essa resposta demanda uma análise bastante técnica de como funcionam as etapas do processo de migração dos consumidores de uma operadora de saúde para a outra em situações em que a empresa é obrigada a vender a carteira de clientes.

Sendo assim, quais são as etapas desse processo de migração de consumidores de uma operadora para a outra?

A primeira etapa é chamada de alienação compulsória da carteira. Nessa etapa, outras operadoras de saúde têm o prazo de até 30 dias para manifestarem interesse em adquirir toda a carteira de clientes da operadora sob intervenção, com a garantia de que serão respeitados os prazos de carência já cumpridos e, também, com garantia de manutenção de preços e rede credenciada.

Esse prazo pode ser prorrogado por mais 15 dias, conforme determina o artigo 10 da Resolução Normativa n. 112, da ANS.

A segunda etapa é chamada de oferta pública e tem início após o insucesso da alienação compulsória. Na oferta pública, são mantidos os prazos de carência já cumpridos, mas não há garantia de manutenção de preço e rede credenciada.

Nessa etapa do processo, qualquer operadora de saúde interessada deverá apresentar propostas, podendo limitar o alcance dessa proposta em relação à abrangência geográfica dos beneficiários (grupo de municípios, estadual ou nacional) e/ou à segmentação contratual (Ex.: todos os planos exclusivamente odontológicos; todos os planos exclusivamente hospitalares; todos os planos sem cobertura odontológica; etc).

O prazo para conclusão das duas primeiras etapas (alienação compulsória e oferta pública) é de até 90 dias, conforme determinado pelo §5º do artigo 24 da Lei n. 9.656/98, mas pode ser concluídas em até 60 dias.

A terceira etapa surge após o insucesso das duas primeiras. Ela é chamada de Portabilidade ESPECIAL (que não se confunde com Portabilidade Extraordinária). Essa portabilidade especial é regulamentada pela Resolução Normativa n. 186, da ANS e ela PODE SER EXERCIDA POR TODOS OS BENEFICIÁRIOS DA OPERADORA SOB INTERVENÇÃO (E NÃO SÓ PELOS CLIENTES DE CONTRATOS INDIVIDUAIS E CONTRATOS EMPRESARIAIS COM ATÉ 29 VIDAS).

Através da portabilidade especial, qualquer consumidor da Unimed Paulistana poderia procurar, por conta própria, um outro plano de saúde em outra operadora e requerer a portabilidade de carências.

Existe alguma exceção para esse processo de migração dos clientes de uma operadora para a outra.

Sim. E é nesse ponto que está a maior vulnerabilidade do processo.

A primeira etapa da migração (a alienação compulsória) é obrigatória. Portanto, durante os primeiros 30 dias, é necessário aguardar a eventual manifestação de interesse da carteira por outra operadora.

Após os primeiros 30 dias, o artigo 7º da Resolução Normativa n. 186 permite que a ANS não siga as demais etapas desse processo de migração e opte por implantar a portabilidade extraordinária, desde que seja demonstrada INTERESSE PÚBLICO.

Os primeiros 30 dias encerraram-se em 02/10/2015 e, nessa mesma data, já estava discutido, aprovado e assinado o famigerado Termo de Ajustamento de Conduta no qual se implantou a portabilidade extraordinária para os clientes da Unimed Paulistana com contratos individuais ou contratos empresariais com até 29 vidas.

Observem que essa portabilidade extraordinária foi oferecida apenas a dois segmentos de clientes da Unimed Paulistana e com opção de migração apenas para contratos de outras poucas empresas que trabalham sob a bandeira Unimed, que ofereceram planos muito inferiores em rede credenciada e com preços maiores do que àqueles que eram cobrados pela Unimed Paulistana.

Foi dito aos consumidores que, em apenas 30 dias, houve intensa discussão entre representantes do Ministério Público Estadual, Ministério Público Federal, PROCON-SP, Unimed Seguros, Unimed FESP, Central Nacional Unimed, Unimed do Brasil e Agência Nacional de Saúde Suplementar.

Após essas “intensas discussões”, houve tempo hábil para criar os novos produtos oferecidos por essas Unimeds, registrá-los na ANS e cadastrar os hospitais credenciados em sistema.

Tudo isso para, um dia após o término do mínimo prazo legal, ser anunciada a portabilidade extraordinária.

O que é esse “interesse público”? Ele foi demonstrado?

O interesse público é aquele que objetiva o bem geral da sociedade.

Nesse caso, ele não foi demonstrado. Na verdade, ele foi utilizado como moeda de troca.

Os clientes da Unimed Paulistana estavam ser a cobertura do serviço contratado e assim ficariam até o término do processo de migração da carteira.

A ANS, então, ofereceu uma solução um pouco mais rápida, aproveitando-se da situação precária dos consumidores, mas que oferecia benefícios MUITO INFERIORES ao da portabilidade especial.

E porque essa medida beneficiou outras empresas de planos de saúde?

O fracasso do processo de alienação compulsória e de oferta pública era, desde o início, certo.

Tratava-se de uma carteira de mais de 700 mil beneficiários e nenhuma operadora de saúde tem condições técnicas e até mesmo interesse financeiro em assumir, sozinha, o aporte de uma carteira de mais de 700 mil beneficiários em tão curto espaço de tempo. Estruturalmente, é inviável.

Com essa suposição em mente, era certo que a ANS teria que implantar o processo de portabilidade especial, MUITO MAIS BENÉFICO AO CONSUMIDOR.

Com a portabilidade especial, os mais de 700 mil beneficiários da Unimed Paulistana poderiam escolher outros produtos em qualquer outra operadora de saúde e portar suas carências já cumpridas, respeitando-se, obviamente, o padrão similar de rede credenciada.

As demais empresas de planos de saúde seriam obrigadas a assumir todos esses clientes sem poder impor prazos de carência.

Já com a portabilidade extraordinária, que foi oferecida apenas aos beneficiários de produtos individuais ou empresariais com até 29 vidas, apenas as empresas do grupo Unimed que assinaram o TAC teriam que aceitar os clientes da Unimed Paulistana sem carência, com o benefício de poder oferecer produtos caros e com rede credenciada inferior.

A aceitação desses clientes era certa na maioria dos casos pois a ANS não ofereceu nenhuma outra opção e se recusou a dizer o que faria após o término do prazo da portabilidade extraordinária (30/10/2015).

EM TERMOS PRÁTICOS, ERA “PEGAR OU LARGAR”.

E os demais clientes da Unimed Paulistana (contratos coletivos por adesão e contratos empresariais com 30 vidas ou mais)?

É evidente que não aguardariam 60 dias para ter orientação da ANS.

Os grandes contratos coletivos por adesão são geridos por administradoras de benefícios e essas trataram de buscar outras empresas para migrar a carteira desses contratos.

Para os contratos empresariais com 30 vidas ou mais, é vedada a imposição de prazos de carência em novas contratações. Portanto, bastava rescindir com a Unimed Paulistana e procurar outra operadora, mas é importante lembrar que as outras operadoras não são obrigadas a assinar o contrato. Uma vez assinado, não podem impor carências. Se constatarem, entretanto, que o contrato não é economicamente interessante, não são obrigadas a assinar.

Como exemplo, podemos citar a situação hipotética de uma empresa com 50 beneficiários, com custo mensal médio de R$ 1.000,00 por beneficiário. A mensalidade total, portanto, importa em R$ 50.000,00. Considere-se, também, que nesse mesmo grupo de beneficiários há um paciente em tratamento oncológico. Há medicamentos quimioterápicos que custam mais do que R$ 40.000,00 por sessão. Logo, um único beneficiário pode comprometer quase toda a arrecadação mensal com um único medicamento. Em uma situação como essa, é bastante provável que a empresa contratante não encontre uma operadora de saúde disposta a assinar o contrato.

E como fica a nova portabilidade extraordinária divulgada em 17/11/2015 pela ANS?

Poucos são os clientes da Unimed Paulistana que não puderam optar pela portabilidade para os planos de outras Unimeds através do Termo de Ajustamento de Conduta e não encontraram outra solução no mercado.

Poucos também são aqueles que, mesmo reunindo condições para portar, recusaram essa “oferta” em razão da péssima qualidade dos produtos oferecidos.

Para esses clientes, independentemente do tipo de contrato, foi oferecida uma nova portabilidade extraordinária, em vigor por 60 dias a partir de 18/11/2015, que lhes permite procurar por outros produtos no mercado, em qualquer operadora de saúde e requerer a portabilidade, mediante a apresentação de 04 comprovantes de pagamento de mensalidades no período dos últimos 06 meses.

Em tese, pelo processo de migração da carteira de clientes, a próxima etapa deveria ser a oferta pública (leilão) da carteira de clientes restante e, após 30 dias, iniciar a fase da portabilidade especial.

A oferta pública seria uma medida totalmente ineficaz nesse momento. Portanto, era mesmo necessário pular para a etapa da portabilidade especial.

Como isso seria uma exceção à regra do processo de migração da carteira, foi então denominada por nova portabilidade extraordinária.

E os consumidores que somente optaram pela portabilidade do TAC porque não tinham opções e que, diante dessa nova portabilidade, mas benéfica, teriam optado por outros planos de saúde ao invés daqueles produtos oferecidos pelas empresas do Grupo Unimed através do TAC?

A central de atendimento do DISC ANS informou até o dia 16/11/2015, que ainda não havia nenhuma orientação ou norma da ANS a respeito do que aconteceria após o término do prazo da portabilidade para os produtos do TAC.

É inacreditável que, às vésperas do término do prazo, os consumidores não tivessem informações claras e precisas sobre o que iria acontecer se não optassem pela portabilidade extraordinária do TAC.

A ANS foi VOLUNTARIAMENTE omissa, forçando os consumidores a aceitar a portabilidade para planos inferiores e caros.

As ações (e omissões) da ANS somente favoreceram outras operadoras de saúde, pois, nesse momento, a quantidade de consumidores que ainda permanecem como clientes da Unimed Paulistana é uma parcela mínima do total de clientes que a empresa possuía no dia 02/09/2015.

Sendo assim, o impacto da portabilidade especial para as outras operadoras de saúde será mínimo e não lhes causará nenhum prejuízo.

O prejuízo já foi pago pelo consumidor, parte sempre mais fraca e que não encontrou apoio em nenhum dos supostos órgãos de defesa de seus direitos.

E o que os consumidores prejudicados pela omissão da ANS podem fazer.

A informação clara e precisa do processo de migração da carteira de clientes da Unimed Paulistana é direito absoluto do consumidor, pois é a única forma de lhes permitir a tomada de decisão consciente.

Muitos consumidores somente optaram pela portabilidade do TAC porque não tinham opções.

Outros se recusaram a portar suas carências para os produtos caros e inferiores oferecidos pelo TAC e decidiram contratar outros planos de saúde, mesmo tendo que enfrentar novos prazos de carência.

Tivessem conhecimento de quando seria finalizada a portabilidade extraordinária do TAC e que, após esse período, teriam direito à portabilidade para qualquer outra operadora de saúde, muitos teriam optado por aguardar as etapas do processo de migração.

Esse processo de migração foi regulamentado, justamente, para que o consumidor tivesse conhecimento de como funciona, quais são as etapas, os prazos e opções.

Sendo assim, entendemos que o consumidor que já contratou outro plano de saúde também tem direito a requerer que lhe seja estendido o direito ao aproveitamento de carências já cumpridas na Unimed Paulistana.

Também entendemos que o consumidor que portou suas carências para um dos produtos oferecidos através do TAC também pode exigir a extensão dos benefícios da nova portabilidade extraordinária, caso demonstre que encontrou uma opção de plano de saúde no mercado.

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Rodrigo Araújo
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